domingo, 11 de abril de 2010

.:: 'Desassossego' destaca a nova geração de cineastas ::.

RIO - O diretor e roteirista Felipe Bragança escreveu uma carta para os amigos. Nela, uma proposta: que cada um realizasse um fragmento de filme como resposta ao texto recebido. O resultado poderá ser conferido em Desassossego, longa-metragem que reunirá vários diretores que descobriram afinidades no modo de fazer cinema, sem que isto signifique uma anulação das diferenças.

– O projeto surgiu de um desejo de trabalhar com cineastas que conhecemos em festivais e que passamos a admirar. Uma geração voltada para a experimentação de linguagem, que acumulou experiência no campo do curta-metragem e está agora na fase de realizar os primeiros longas – explica Marina Meliande, que conduz o projeto ao lado de Bragança.

Embarcaram na proposta Marco Dutra, Juliana Rojas, Caetano Gotardo, Ivo Lopes Araújo (com colaboração dos irmãos Ricardo e Luiz Pretti), Helvecio Marins Jr., Clarissa Campolina, Raphael Mesquita, Leonardo Levis, Carolina Durão, Andrea Capella e Gustavo Bragança, além, claro, de Marina e Bragança. Convidado especial, Karim Aïnouz também assina um dos fragmentos. Afinal, Aïnouz e Bragança vêm perpetuando uma bem-sucedida parceria na criação de roteiros, a julgar pelo longa O céu de Suely (2002) e pela série Alice, da HBO.

“Ficção científica musical sobre o amor”

Contemplado pelo projeto Rumos Cinema e Vídeo, do Itaú Cultural, Desassossego não será estruturado como uma sucessão de curtas. Na montagem, Marina entrelaçará os fragmentos de cada diretor num corpo único de 52 minutos de duração. Quando ficar pronto, o filme será enviado a 2010 pessoas selecionadas entre diretores, amigos e amigos dos amigos. E cada uma terá a oportunidade de formular uma reação, assim como fizeram os cineastas ao receberem a carta de Felipe Bragança.

Marco Dutra e Juliana Rojas, parceiros habituais de trabalho – em curtas premiados como O lençol branco (2003) e Um ramo (2007), e, agora, no longa Trabalhar cansa, que vão começar a rodar nos próximos dias – respondem por um dos fragmentos.

– Nosso fragmento é uma ficção científica musical sobre o amor. Quisemos reunir os gêneros de que mais gostamos – conta Dutra, assumindo o sopro nostálgico que atravessa o trabalho. – Filmamos em VHS, formato que remete à nossa infância e que desapareceu nos últimos tempos. Quando olhamos para uma imagem com essa resolução ela surpreende pela carga memorialista.

A preocupação com o artesanal se revelou fundamental no filmete.

– Nos sentimos como crianças. A nave espacial foi feita com papelão e sucata. Utilizamos objetos para fazer ruído. E entortamos o eixo da câmera para fabricar os efeitos. Há um aspecto lúdico que é novo no nosso trabalho – avalia Marco Dutra.

Já Caetano Gotardo, elogiado pelo curta Areia (2008), concentrou seu foco de atenção na palavra.

– Meu fragmento é um lampejo de imagens que surge a partir das palavras, enquanto os atores falam um poema – resume Gotardo, que dirigiu Rômulo Braga (com quem tinha trabalhado no curta O menino japonês, de 2009) e Nuno Gil.

Felipe Bragança e Marina Meliande também conduziram fragmentos em Desassossego (título extraído de Livro do desassossego, de Fernando Pessoa), projeto que fecha uma trilogia realizada por ambos – o primeiro foi A fuga da mulher gorila, de 2008 (seu primeiro longa, vencedor da Mostra de Tiradentes do ano passado), e o segundo, A alegria, em fase de finalização.

– É uma trilogia sobre a representação da juventude no Brasil de hoje. E abordamos a inquietação do que é fazer cinema no país atualmente – assinala Marina, integrante de uma turma que se arrisca em projetos ousados, a julgar por Sábado à noite (2007), de Ivo Lopes Araújo; Estrada para Ythaca (de 2009, premiado na última Mostra de Tiradentes), dos irmãos Pretti (em parceria com Guto Parente e Pedro Diógenes), e Trecho (2007), de Clarissa Campolina e Helvecio Marins Jr.

Daniel Schenker , Jornal do Brasil - 22:53 - 30/03/2010

Fonte: Jornal do Brasil_JB Online

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